Para crianças e adolescentes que já tinham o trabalho como uma imposição antes da covid-19, as horas diárias debruçadas ao serviço foram intensificadas. Com o crescimento do desemprego, as escolas fechadas e sem terem como assistir às disciplinas online, muitos acabaram pressionados a ocupar o tempo participando de fato do sustento da casa.
No município de Barra do Ribeiro, interior do Rio Grande do Sul, André*, de 14 anos, já ajudava o pai na lavoura no contraturno escolar e aumentou sua carga de trabalho, preenchendo os horários sem as aulas presenciais com serviço para os vizinhos. No mesmo estado, em São Luiz Gonzaga, Danilo*, de 15 anos, dobrou o expediente como ajudante de pedreiro.
Circunstâncias como essas também apareceram na dissertação de mestrado de Lucas Ávila, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (Puc Minas). O pesquisador acompanhou, em 2020, 11 estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental, com idades entre 14 e 16 anos, da Escola Estadual José Miguel do Nascimento, uma das unidades escolares com o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) mais baixo em Minas Gerais para essa faixa etária.
No estudo, Lucas identificou atividades laborais durante a manhã e a tarde em 6 dos 11 entrevistados. Um deles acompanhava o tio no açougue o dia inteiro, o outro passou a seguir o pai como ajudante de pedreiro, em obras das 6h às 15h.
As conversas com os meninos mostraram que o trabalho é mais uma exigência da própria família no aumento da renda do que algo relacionado à autonomia dos sujeitos e à emancipação econômica. “A falta da presença física da escola criou a noção de que aqueles estudantes não estavam ocupados o suficiente durante boa parte do dia”, compreendeu Lucas.