Não foram só os portões das escolas que se fecharam para proteger a população do coronavírus, mas também janelas de aprendizado, de proteção, de denúncia e de alimento.
No primeiro semestre de 2020, o Disque 100 (Direitos Humanos) recebeu, em média, 10 denúncias por dia referentes à exploração da mão de obra infantil. O dado inédito, obtido pela reportagem via Lei de Acesso à Informação, aponta que em todo o país foram 1.859 registros em seis meses. No ano de 2019, eram cerca de 11 denúncias diárias (um total de 4.246 em 12 meses). Apesar de aparentar uma ligeira queda, no ano passado o número pode ser lido como alto, de acordo com especialistas, justamente por estar subnotificado em uma época atípica de isolamento social.
Doze jornalistas espalhados pelo país foram às ruas e fizeram escuta de profissionais que estão na ponta, diante de famílias vulneráveis, e perceberam a intensificação do problema. As situações que abriram essa matéria foram vistas e narradas por um professor, um conselheiro tutelar, um auditor fiscal, um procurador do trabalho e um dos repórteres. Entrevistamos mais de 20 fontes, incluindo pesquisadores, especialistas e representantes de entidades ligadas à temática.
Os relatos contemplam as piores formas de trabalho precoce: trabalho doméstico, análogo à escravidão, tráfico de drogas, lavouras, garimpo, catação, mendicância, aplicativos de entrega. Mas também há casos que costumam ser romantizados ou relativizados, como filhos “ajudando” na lanchonete dos pais ou fazendo doces para vender no bairro, contribuir em casa, comprar um presente para a mãe.